sexta-feira, maio 15, 2020

hálito

como seria
se pudesse beijar
a própria boca

costume

te disse
faria prevalecer esta imagem
simples maneira medrosa
mas se explicar ficarei óbvio demais
e pessoas não gostam de obviedades
logo quando se esfrega na cara perdas de amor
alguns tomariam por piegas
apesar dos gurus em redes sociais
seguirem o sucesso moral de seu tempo

te pegunto
devo abreviar o sentido da fala
seguindo em alucinação?
que possas compreender quando te chamo
para que me enxergues nos olhos, dente por dente
sabes as vezes que te chamei assim [foram poucas
nosso tempo curto, ânsia que aumenta
alguma coisa indescritível entre duas imagens
eu, tu e a porta
falei duas, mas são três
não se trata de me despedir
tampouco de ficar
aludo ao tempo que quebre o impasse

que pena
sinto muito
meus pêsames
meus sentimentos
sinta-se abraçado
quantas repetições mecânicas ouvirias
em derradeira ladainha?
nos imaginei despedidos da adolescência
pois não cabem mais revoltas num mundo morto
viraram-se léguas as cabeças abaixo
é pendurado que sigo falante
grito para os que nos observam do chão
então aquela montanha russa se disfarça de pêndulo no parque de diversões
quero descer, a qualquer momento a segurança cederá

conheço a adrenalina
que antevê o desastre
mas nada acontece
estou aos gritos com desconhecidos
e quando descer quero voltar de novo
mas será tarde?
quer dizer, não sei como aproveitar isso aqui
sem pensar em todas as possibilidades de dar errado
faz parte do jogo exaustivo com o frio na barriga
sopro de morte qualquer que avisa do perigo
mesmo se resta gozo
sinto as pernas coladas contigo
o calor úmido me transforma nos odores
na noite em que não te saciei
continuaste envolvendo-me a cintura

deixa-me ir, porra
agora posso falar, não pareço mais óbvio
pois tarda o mal de um século
e tenho medo de ser o vazio cafona dessa geração
queria tudo, talvez até a pompa
e sei que mesmo isso me enoja
perdi o sentido pela fama
se não podes me ouvir, que me veja
aviso aquilo que os cães ladram quando mordem
o peso notívago dos tempos
te quero sem querer
e ainda não fui embora
é depois do orgasmo que vem a fragilidade do estômago
sabes que odeio vomitar e te peço paciência,
prefiro a merda
e o problema sou eu
não tenho nojo
sou o piegas

mas mesmo o piegas teme, como num conto de fadas abrupto
quando belezas infantis inexistem em ditado popular
peço um abraço a portas trancadas
pois se não vejo a hora de ir
é porque me limitas certezas de saudade
não posso com a dependência
tampouco me abstenho do vínculo
ambos, o cômodo e a distância
avançarei sobre a turbulência
até que me acostume com aviões
contanto que aprendas sobre lentidão
é na janela dos ônibus que me encontro
peço um abraço a portas trancadas
para que, na manhã seguinte,
abrir a porta não seja uma fuga